CHARLATANISMO TEOCRÁTICO IMBROCHÁVEL*

Wallace de Moraes1

Segundo Whilhelm Reich (1988), o fascismo é a expressão máxima do misticismo religioso: “o fascismo apoia a religiosidade que provém da perversão sexual e transforma o caráter masoquista da velha religião patriarcal do sofrimento numa religião sádica.”

Na data de comemoração dos 200 anos de independência do Brasil de Portugal, o presidente-candidato diante de uma multidão de seguidores pediu um coro para si mesmo, aos gritos: “imbrochável”, “imbrochável”, imbrochável”! A história nos ajuda a entender essa postura.

Os colonizadores (todos homens brancos cristãos) que conquistaram as Américas e praticaram o tráfico negreiro pela força da baioneta (Frantz Fanon), viam-se como superiores àqueles povos que aqui viviam sem roupas e sem religião. O estupro das indígenas e africanas era algo comum para esses paladinos da religião. Eles consideravam-se viris, conquistadores e comungavam dos princípios de uma sociedade patriarcal legitimada por sua religião e pelo seu Estado.

A suposta independência brasileira em 1822 não significou nada para negros e indígenas que continuaram escravizados, açoitados, humilhados, tendo suas terras roubadas, seu habitat destruído e seus corpos estuprados, muitos pegos a laço.

Na Alemanha nazista, o governo do cabo do exército, Adolf Hitler, recebia todo apoio das igrejas e de seus seguidores. Ele reunia multidões pelo país para destilar um ódio ao diferente. Assim, comunistas, esquerdistas, LGBTQIA+ e, como se sabe, judeus, eram seus principais alvos. Virilidade, força e conquista ocupavam papel central no imaginário do poder nazista que estabelecia como meta matar o inimigo. Era a aplicação do “nós x eles”.

Em comum, colonizadores e nazistas amplamente apoiados pelas igrejas consideravam-se arautos da boa moral e dos bons costumes. Fizeram tudo em nome de Deus e pela pátria. Eram conquistadores, viris, patriarcais, patriotas e imbrocháveis.

Nesse ínterim utilizam o nome de Deus para propagar o discurso de ódio contra o opositor, o diferente, apresentando-os como beberrões, ladrões, esquerdistas, mulheres, gays, lésbicas… brocháveis.

Pregam a liberação das armas (para quem pode comprar, é claro); são coniventes com a existência de grupos paramilitares que extorquem e amedrontam comunidades inteiras; defendem as ações políticas que estimulam a destruição das florestas e matam os povos indígenas; apoiam as invasões de favelas que matam pobres e negros; são contra as vacinas. A alusão a Jesus, que nunca defendeu o assassinato de ninguém, caracteriza um verdadeiro charlatanismo teocrático, que, evidentemente, é racista. Os lemas “Brasil acima de tudo e Deus acima de todos” e “bandido bom, é bandido morto” expressam a união entre princípios de religião, do patriarcado, da guerra, dos imbrocháveis, realizado por charlatões teocráticos.

Talvez, Freud explique o sentido de dizer-se em coro como “imbrochável”.

Por fim, o psicanalista Whilhelm Reich, versando sobre o fascismo disse: “a ideologia da raça é uma grande expressão biopática pura da estrutura do caráter do homem orgasticamente impotente”.

1 Doutor em Ciência Política. Professor dos Programas de Pós-Graduação em Filosofia (PPGF), de História Comparada (PPGHC) e do Departamento de Ciência Política, todos da UFRJ. Membro do Quilombo do IFCS/UFRJ e líder do grupo de Pesquisa CPDEL/UFRJ (Coletivo de Pesquisas Decoloniais e Libertárias). Canal no Youtube: https://www.youtube.com/channel/UCI6ALgmE_efoCONkrPmQ9fw.

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