CARTA ABERTA DO QUILOMBO DO IFCS SOBRE O RESULTADO DA SINDICÂNCIA DO CASO DE RACISMO NO DPTº DE CIÊNCIA POLÍTICA DA UFRJ

Rio de Janeiro, 08 de dezembro de 2021.

Em pleno novembro negro, às vésperas da data comemorativa dos 50 anos (1971-2021) da proposição do 20 de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra e 150 da Lei do Ventre Livre (1871-2021), quando não mais podia nascer alguém escravizado no Brasil, a UFRJ disponibilizou o resultado da sindicância sobre investigação sobre procedimentos administrativos e individuais que envolvia ofensas racistas no Departamento de Ciência Política (DCP). 

Infelizmente, os atos discriminatórios realizados contra o único prof. negro do Depto foram esvaziados. A não aplicação de sanções administrativas baseou-se nos testemunhos e narrativas selecionadas. Coube à comissão avaliar se aos professores Thais Florencio de Aguiar e Pedro Luiz da Silva do Rego Lima cometeram erros e ofensas na condução da reunião do DCP de 11/08/2021, bem como se o professor Francisco Josué Medeiros de Freitas havia cometido ofensas e, inclusive, ato de discriminação racial na referida reunião. Coube à maioria dos envolvidos e às testemunhas externas chamadas pelos acusados comprovarem as inocências com apoio de seus advogados diante da comissão. O direito à ampla defesa foi exercido, como deve ser, mas o direito ao contraditório, não foi, pois os advogados do prof. Wallace não puderam acompanhar as oitivas, nem apresentar perguntas às testemunhas ou aos acusados, nem mesmo tiveram acesso aos autos do processo durante a sindicância. Mas esse não foi um problema deliberado da comissão de sindicância. Ela agiu dentro da Lei que rege as normas estabelecidas pela Lei 8.112 e o Regime Jurídico Único (RJU). É importante, inclusive, salientar que essas leis sejam dessa forma, pois assim evitam quaisquer tipos de perseguição política e não abre margem para demissões como resultado de “picuinhas” no interior do funcionalismo, oriundas de desavenças políticas. 

Não obstante, a Lei nº 8.112/90 não prevê expressamente nenhuma punição administrativa específica para práticas de racismo, injúria racial, LGBTQIA+fobia, machismo ou outras discriminações, evidenciando uma institucionalidade racista, patriarcal, LGBTQIA+fóbica, em duas palavras, moderna e colonialista. Uma das nossas pautas deve ser a inclusão dessas possibilidades para resguardar àqueles que sofram de perseguição discriminatória de qualquer natureza.

Diante da legislação atual, a comissão de sindicância sugeriu a punição de advertência para o prof. Francisco de Josué Medeiros. No entanto, o relatório possui inconsistências gravíssimas que exculparam os outros dois acusados, professores Thais Florencio de Aguiar e Pedro Luiz da Silva do Rego Lima. 

O Quilombo do IFCS defende a publicização de todas as gravações, oitivas de sindicância e reuniões que fizeram parte do caso de racismo contra o professor Wallace de Moraes, pois se trata de caso emblemático e exemplar para a luta antirracista. A partir destas evidências, cuja publicização integral defendemos, apresentamos os seguintes pontos:

  1. Até hoje, a chefia não produziu a ata da reunião departamental do dia 11 de agosto, portanto, mais de três meses depois do ocorrido. A chefia, Thais Florencio de Aguiar e Pedro Luiz da Silva do Rego Lima, convocou uma reunião para o dia 5 de outubro e não apresentou a ata da última reunião, do dia 11 de agosto, para aprovação. Não confeccionar/registrar a ata da reunião, como deve ser feito em toda reunião de colegiado da UFRJ, omitindo assim a condução da chefia e dos demais membros do DCP naquela reunião marcada por condutas discriminatórias e absolutamente inadequadas constitui um dos sérios problemas daquela chefia. 
  2. Todavia, nos parece óbvio que a chefia não produziria provas contra si mesma. Do mesmo modo, se tivesse gravado a reunião do dia 11 de agosto, com um gravador, seria mais conveniente afirmar que não havia qualquer gravação da reunião, como foi feito. Por isso e por outros motivos, vários membros da congregação solicitaram o afastamento da chefia do DCP durante a apuração dos fatos pela sindicância.
  3. Não obstante, é estranho constatar que a comissão de sindicância instaurada para apurar os fatos do dia 11 de agosto não tenha feito a solicitação da ata da reunião à chefia. A ata da reunião não seria importante para os trabalhos da sindicância? Essa não deveria ser o primeiro pedido da comissão de sindicância? Ou uma ata não tem nenhuma importância para ajudar nos entendimentos dos acontecimentos de uma reunião departamental que é o objeto da sindicância? A ausência/inexistência da ata não ajudou a isentar os chefes de responsabilidades? Esse motivo por si só não colocaria em questão a má condução da chefia? Se realizou o pedido da ata da reunião à chefia, e lhe foi negado, a comissão deveria colocar essa informação no relatório e levar em conta para embasar inclusive o pedido de afastamento da chefia durante o período da sindicância? 

Além dos motivos supracitados, seguem abaixo justificativas graves que contestam a inocência da chefia do DCP divulgada pela comissão de sindicância. É importante salientar que todos os documentos que comprovam nossos argumentos estão nos autos da sindicância.

  1. A chefia do DCP recebeu a indicação do nome do prof. Wallace de Moraes para compor a banca dentro do prazo estabelecido por ela mesma, realizada pelo prof. Luiz Eduardo Motta, através de e-mail. Ao receber a lista com a indicação, a chefe do DCP, profa. Thais Aguiar, ligou imediatamente para o prof. Motta questionando a indicação do nome e exigindo a sua retirada. As provas destes atos foram encaminhadas para a comissão, mas não foram consideradas no relatório conclusivo. Por quê? Não eram relevantes?
  2. O prof. Valter Duarte também indicou o nome do prof. Wallace de Moraes para a banca. A chefia alegou por e-mail que o nome havia sido enviado fora do prazo. O prof. Valter lembrou a ela que o prof. Luiz Eduardo Motta havia enviado dentro do prazo. Ela respondeu: “Parece ter havido algum equívoco”, e não aceitou a inclusão do nome do prof. Wallace de Moraes. Como caracterizar tal atitude? Seria uma deliberação para negar a participação do prof. Wallace na banca? Por quais motivos, a chefe do DCP não queria de modo algum a participação do prof. Wallace na banca? Isso não soou estranho para a comissão de sindicância, por quê?
  3. Mesmo assim, quando iniciou a reunião do dia 11 de agosto, a chefia não apresentou o nome do prof. Wallace para composição da banca e ainda disse que não havia recebido o nome há tempo. Assim, ela faltou com a verdade para os membros do colegiado. A reunião começou a partir de uma mentira que desgastou os participantes, gerando uma longa discussão sobre a necessidade de indicação de um membro interno. Uma chefia de um departamento pode agir dessa maneira com seus pares? Pode lhes omitir informações verdadeiras? Essas evidências seriam motivo para alguma consideração pela comissão de sindicância? A profa. não seria passível de punição? Isso tudo é normal? Não deveria ter sido perguntado à chefia do DCP porque tanto interesse em excluir o prof. Wallace da participação da banca? Essa é uma postura adequada de um servidor público?
  4. Não obstante, é papel de uma chefia de departamento ligar para um de seus membros questionando a indicação do nome de um colega? Seria assédio essa atitude da chefia do DCP? Essas posturas justificariam pelo menos uma advertência para que servisse como um sinal positivo institucional da UFRJ para a luta contra arbitrariedades e racismo institucional, tendo em vista que o prof. excluído é o único negro no Depto? É adequado à chefia apoiar um processo de exclusão de um dos professores sem fundamentação técnica/epistemológica/administrativa? Mas a comissão de sindicância não viu nenhum problema nessa postura? 
  5. O prof. Pedro Luiz da Silva do Rego Lima, vice-chefe do Departamento, por diversas vezes na plenária disse que tinha que ter uma pessoa equilibrada para participar da banca e dirigiu a reunião junto com a chefe do Depto, fazendo questão de concordar com tudo o que Josué disse. Mesmo assim, foi absolvido pela sindicância. Para a comissão de sindicância nada disso se constitui como problema, não houve falta de urbanidade, nem racismo. Tudo normal! 
  6. Outrossim, as professoras Monica Bruckmann e Beatriz Bíssio e os profs. Valter Duarte, Luiz Eduardo Motta e Wallace de Moraes questionaram o absurdo de ter que indicar COM ANTECEDÊNCIA um nome de um professor do próprio departamento para suposta análise de seu currículo e ver se poderia participar de uma banca. Mesmo assim, depois de longo debate com mais de uma hora de discussão, a profa Thais Aguiar e Pedro do Rego Lima sustentaram até o fim a negação da indicação do prof. Wallace para a banca. Como caracterizar a exclusão insistente e deliberada de um colega, o único negro no DCP? A comissão de sindicância não percebeu nenhum problema nisso? 
  7. A nota assinada pelos professores Francisco Josué Medeiros de Freitas, Pedro Lima, Thais Aguiar, Daniela Mussi, Jorge Chaloub e Mayra Goulart, no dia 25 de agosto, admitiu que, durante a reunião para indicação da banca: “É verdade que o nome do colega Wallace dos Santos de Moraes foi mencionado durante a discussão desse ponto”. No entanto, a referida nota faltou com a verdade ao dizer que outros nomes do DCP foram indicados para compor a banca na reunião do dia 11 de agosto. A chefia, ciente de todos os fatos assinou essa nota, mentindo para a opinião pública e para os membros da congregação do IFCS. A comissão de sindicância não levou isso em conta? Uma chefia no exercício da sua função pode faltar com a verdade para os demais membros da comunidade acadêmica e para os membros do colegiado do DCP só para justificar a exclusão do único prof. negro do Depto? Por que a comissão de sindicância não apurou esses fatos e não os levou em consideração?
  8. Em nota divulgada no dia 25 de agosto, a chefia apresentou uma meia-verdade à comunidade acadêmica. Eles disseram que os professores negaram a participação de todos os profs. associados do DCP e foi exatamente isso que foi cinicamente votado ao final da reunião. Todavia, eles escondem uma informação importantíssima, a saber: nenhum outro nome de prof. interno da UFRJ foi apresentado para participar da banca além do prof. Wallace de Moraes. Ademais, é importantíssimo salientar que alguns membros do DCP foram consultados pela própria chefia, antes da reunião do dia 11 de agosto, se queriam participar como membros internos da banca, como as profas. Beatriz Bíssio e Anna Marina. O veto, portanto, foi exclusivamente ao prof. Wallace de Moraes. Isso não poderia ser caracterizado como perseguição pessoal? O que impede que essa perseguição explícita possa ser enquadrada como racismo, tendo em vista que o prof. perseguido é o único negro do DCP? O prof. Wallace apresentou essas informações à comissão de sindicância em seu depoimento. Por que a comissão não levou essas graves evidências em consideração?
  9. Quando o prof. Josué Medeiros proferiu as palavras humilhantes e discriminatórias contra qualquer possibilidade de participação do prof. Wallace de Moraes na banca, indicando inclusive “vitimizações raciais”, a chefia além de não coibir palavras discriminatórias ainda as reforçou dizendo que concordava com aquilo que o prof. Josué havia dito. Diante de atos discriminatórios, de violência verbal em espaço público da universidade e em tom de voz exacerbado dirigido a um membro do colegiado, é papel da chefia departamental, de acordo com a Lei 8.112, coibir tais atitudes e chamar a atenção do agressor. A chefia não procedeu dessa forma. Não foi por falta de aviso, pois as professoras Beatriz Bissio, Monica Bruckman, e os professores Valter Duarte e o próprio Wallace de Moraes externaram que estava ocorrendo um ato de discriminação diante de todos e que isso não deveria ser permitido. Todavia, a chefia do DCP não só ignorou os apelos, como optou por não coibir o prof. Francisco Josué Medeiros. Por que os testemunhos dessas pessoas relatando esses fatos não foram considerados pela comissão de sindicância? Isso não seria grave? Será que a comissão não percebeu que, ao que tudo indica, Thais Aguiar, Pedro Lima e Josué Medeiros participaram juntos e em sintonia para a exclusão do prof. negro? O que mais é necessário para perceber atuação em conjunto com objetivos comuns?  
  10. O prof. Francisco Josué Medeiros reconheceu suas ações e supostamente pediu desculpas em nota enviada, ao que parece, exclusivamente, para o Coletivo de Docentes Negras/os da UFRJ (é verdade que esse pedido contém uma série de problemas de interpretação sobre o significado de racismo, fato que fez o Coletivo de Docentes Negras/os da UFRJ entendê-lo como um pedido falso e cheio de inconstâncias). Por outro lado, a chefia do DCP insistiu em uma espécie de “negacionismo” do dia 11 de agosto. Não pediu desculpas públicas ao prof. Wallace de Moraes, nem ao colegiado do DCP, nem à congregação do IFCS pelas deliberadas omissões e mentiras proferidas, com o fim específico por excluir o nome do prof. Wallace da participação da banca. O que nos leva a uma curiosidade que não quer calar: Por que tanto empenho em excluir um prof. da participação de uma banca de concurso público? Será que o prof. Wallace poderia ser um empecilho para alguma “costura” (palavra utilizada por Josué na conversa de WhatsApp disponibilizada à comissão para dizer que a indicação do prof. Wallace atrapalharia a formação da banca do concurso que ele fez para favorecer um determinado candidato, como dito por ele nessa conversa). Resta saber se o prof. Francisco Josué Medeiros atuou sozinho ou se contou com a colaboração da Chefia para a “costura” realizada para escolha da banca do concurso, excluindo o prof. Wallace sem justificativas acadêmicas ou administrativas? 
  11. Certo é que Thais Florencio de Aguiar e Pedro Luiz da Silva do Rego Lima estavam em tamanha sintonia com Josué Medeiros que, quando o prof. Wallace de Moraes foi se defender dos atos discriminatórios realizados por este, a chefia disse que tinha passado do tempo, ameaçou que cortaria a sua fala e ainda disse que ele estava tumultuando a reunião, o que igualmente estava registrado nos autos da sindicância. 
  12. Ademais, a chefia departamental não respeitou a Resolução nº15/20 do Consuni que versa sobre diversidade de cor e gênero nas bancas de concursos da UFRJ. Mas para não se enquadrar na resolução supracitada, afirmou que o concurso estava regido por uma resolução anterior. Isto é, existe uma resolução que aponta para a necessidade de concursos com diversidade de cor e de gênero e a chefia para ignorá-la justifica que o concurso foi aprovado com data anterior. Até mesmo quando a UFRJ tem uma resolução antirracista, a chefia do DCP, resolve não a respeitá-la. Mesmo alertada sobre o fato, a chefia resolveu manter o seu veto ao prof. Wallace de Moraes e ignorar a resolução do CONSUNI. A comissão de sindicância não deveria levar esses fatos em consideração? 
  13. Na reunião da congregação do IFCS, no dia 13 de agosto, para aprovação da banca indicada na reunião do dia 11 de agosto, o prof. Valter Duarte asseverou que se a UFRJ não poderia ter maioria na banca do concurso, outras instituições também não poderiam ter essa prerrogativa, pois a banca indicada possuía maioria da UERJ. Para rechaçar tal argumentação, a chefia mentiu ao dizer que o IESP não pertencia à UERJ e que, portanto, não haveria maioria desta instituição na banca por ela indicada. Este documento está nos autos do processo.
  14. A chefia alegou que não gravou a reunião. Todavia, demorou três dias para responder a essa simples pergunta realizada por diversos membros da Congregação do IFCS do dia 01 de setembro. Muitos membros declararam sentir-se desrespeitados com a atitude da chefia. Por que tanta demora para responder uma simples pergunta? Se a chefia não gravou a reunião com um gravador, como era a prática do Depto, porque não avisou imediatamente? A demora nessa resposta pode dar a entender que existia mais de uma opção de escolha e que, portanto, era melhor pensar com calma na melhor resposta. Se a chefia não grava as reuniões com um gravador, como ela produz as atas, da sua própria memória e conveniência? Nada disso foi relevante para a comissão de sindicância?   
  15. Como erro ou como forma de evitar o controle dos votos da plenária, a chefia não convocou os representantes discentes para participarem da reunião do DCP do dia 11 de agosto. É importante ressaltar que é um direito dos discentes participarem das reuniões departamentais.
  16. O prof. Josué Medeiros que disse que o prof. Wallace de Moraes se vitimizava por questões raciais, que tudo para ele era racismo e que era incapaz de participar de uma banca de concurso, que seria uma loucura se presidisse a banca de um concurso, que era conflituoso, brigão, desequilibrado etc., que justificou a exclusão do seu nome da banca sob esses argumentos, sofreu uma advertência pela comissão, como preveem as regras. Todavia, o que pensar das pessoas que votaram com ele? O que pensar das pessoas que o apoiaram e ainda o apoiam? Será que há alguma relação com racismo, colonialismo, colonialidade, discriminação, branquitude, conivência, cumplicidade, concordância? 
  17. A CGU e a Lei 8.112/90 podem prever esses atos somente como falta de urbanidade, mas nós estudiosos do tema e que sentimos racismo institucional desde quando nascemos, sabemos exatamente do que se trata e por isso, para nós, é mais difícil esquecermos. A branquitude não entende isso. 
  18. Para efeitos didáticos, vamos retirar o aspecto racial da questão. Imaginemos um Depto. só com homens brancos e uma única mulher branca. Um determinado prof. justifica que a mulher não pode participar de uma banca porque é desequilibrada, conflituosa, brigona, vitimista. Ao dizer isso, a chefia do Depto, de homens brancos, ratifica e não coíbe o ataque de um dos professores. Como seria interpretada tal situação? Machismo? Patriarcado? Misoginia? Algo equivalente pode ser dirigido aos membres da comunidade LGBTQIA+ sem qualquer interpretação de discriminação explícita?
  19. Será que até para interpretar um caso como esse, é necessário fazer comparação com um caso de mulheres brancas para aumentar a sensibilidade e fazer com que os brancos compreendam o que é discriminação explícita? Isso mostra o quanto estamos colonizados e não entendemos a dor da discriminação racial. Os mais racistas ainda vão justificar que não se pode comparar a exclusão de uma mulher com a de um negro, portanto, buscará minimizar a questão racial. Por isso, ainda é necessária muita luta contra o racismo.
  20. Em suma, existe um fato, inegável, que foi a exclusão do nome do prof. Wallace de Moraes da participação de uma banca de concurso. Fato conduzido, dirigido e amplamente apoiado pela chefia do DCP que permaneceu irredutível, mesmo diante dos avisos de que se estava realizando um veto discriminatório. Como não foram apresentados nenhum motivo acadêmico e/ou administrativo para a exclusão do prof. da banca, todas as argumentações que foram apresentadas foram de cunho pessoal depreciativo e, portanto, discriminatórias, ampla e abertamente defendidas na reunião.   
  21. No parecer do relatório para justificar a não punição dos profs Thaís Florencio Aguiar e Pedro do Rego Lima, a comissão de sindicância não levou em conta cinco aspectos fundamentais: 1) o cargo de chefia que ocupam com atribuições específicas; 2) o fato de terem dirigido em conjunto aquela reunião do dia 11 de agosto; 3) o e-mail recebido com a indicação do prof. Wallace no prazo estabelecido pela própria chefia; 4) a chefe do Depto ter ligado para o prof. Luiz Motta questionando a indicação do nome do prof. Wallace de Moraes; 5) por fim, os chefes encaminharam a proposta de votação e votaram pela não participação de membros internos na banca, quando o único nome apresentado foi o do prof. Wallace de Moraes, mesmo depois de terem convidado outros professores do DCP para participarem da banca. 
  22. Por que essas evidências não soaram estranho para a comissão de sindicância? Uma chefia departamental não tem atribuições de manter a urbanidade de uma reunião dirigida por ela? Uma chefia departamental não deveria chamar a atenção de um professor que agride outro? Como agravante, além de não coibir, os chefes fizeram questão de explicitamente concordar com as palavras do agressor, inclusive materializando essa concordância com voto. Por que a sindicância não atentou para isso? 
  23. Em suma, a chefia do DCP, Thaís Aguiar e Pedro do Rego Lima, trabalhou deliberadamente, inclusive, utilizando-se de inverdades para impedir que o único prof. negro pudesse participar da banca de concurso organizada pelo próprio departamento. De forma decepcionante para a luta antirracista, a comissão de sindicância não reconheceu nenhum desses atos como aviltantes.
  24. O resultado final da sindicância acusatória propôs: 1) uma advertência ao prof. Francisco Josué Medeiros de Freitas, mas não fez nenhuma menção a racismo; 2) nenhuma advertência aos chefes do DCP. O desfecho com relação aos chefes do Depto, isentando-os de qualquer responsabilidade na exclusão arbitrária ocorrida em todo o processo, bem como apenas uma simples advertência para o agressor, atentam diretamente contra toda a comunidade negra brasileira e universitária em particular.

JUSTIFICATIVAS APRESENTADAS PELA COMISSÃO DE SINDICÂNCIA

  1. Considerando que mais pessoas disseram “não se lembrar” da atuação da chefia, a comissão, a despeito das pessoas que se lembraram muito bem do ocorrido e o relataram com detalhes, resolveu não aplicar nenhuma sanção à chefia pelos seus atos, porque um número maior de pessoas disse “não se lembrar” do acontecido. É como se em um julgamento, os nazistas em ampla maioria dissessem que não se lembravam dos campos de concentração e os poucos sobreviventes relatassem da sua existência. Por maioria simples, os julgadores resolvessem pela absolvição, porque um número maior de pessoas disse “não se lembrar”. Esse procedimento de maioria simples é justo, correto? 
  2. Para justificar suas opções a comissão de sindicância escreveu: “não é condição necessária para o exercício da função de prof. universitário integrar bancas de concurso público.” Nesse aspecto, ela está correta em parte. Certamente, nenhum professor está obrigado a participar de bancas de concurso. Todavia, esquece a comissão de sindicância, que caso queira participar, um professor, atendendo os requisitos acadêmicos e administrativo, está apto e tem esse direito. Aliás, constitui-se enquanto um dos atributos dos professores universitários participar de bancas em geral. Sob os referidos argumentos, a comissão dá a entender que é comum que uma banca de concurso público seja formada apenas por membros externos à universidade e que os colegas vetem o nome de um professor com formação na área do concurso e com condições administrativas para participar da banca, mesmo que outros seis colegas indiquem seu nome. Ademais, os atos da administração pública devem ser motivados com razoabilidade técnica, portanto, não é possível excluir um professor de uma função desqualificando-o, sem justificativas acadêmicas. Há um dano à sua moral e ao seu exercício profissional. 
  3. Indagamos, ainda duas questões: 1) é comum escolher apenas membros externos para montar uma banca na UFRJ, MESMO TENDO ESPECIALISTA NA ÁREA DO CONCURSO DENTRO DO DEPTO QUE SE DISPONHA A PARTICIPAR DA BANCA? 2) alguém conhece algum prof. da UFRJ, que faz parte de dois programas de pós-graduação, que tem vários orientandos de mestrado e doutorado, que não faça parte das suas funções participar de uma banca, seja ela qual for, caso ele queira? 
  4. Por que a comissão de sindicância não recomendou a abertura de um PAD para investigar os atos discriminatórios realizados pelo prof. Francisco Josué Medeiros e amplamente apoiados pelos prof. Pedro do Rego Lima e pela profa. Thaís Florencio Aguiar?
  5. Infelizmente, diante do resultado dessa sindicância, o sinal que percebemos é que não existem grandes custos administrativos para quem ofende um prof. negro, um aluno negro, um técnico-administrativo negro na UFRJ. Pode-se deliberadamente discriminar e excluir um prof. negro da participação de uma banca. Ao exculpar os profs. Thais Florencio Aguiar e Pedro do Rego Lima, os movimentos contra toda forma de discriminações na UFRJ e no Brasil perdem. Seria imprescindível pelo menos o reconhecimento dos atos de arbitrariedade. Ao não registrar o reconhecimento dos atos discriminatórios realizados, fartamente comprovados com testemunhos e documentos, a UFRJ erra peremptoriamente. É esse o sinal que a UFRJ emite para a comunidade acadêmica e para a sociedade? Houve esvaziamento da questão racial no processo? Existe racismo institucional na UFRJ? 

5) Muitas pessoas, velada ou abertamente, têm defendido que não sejam mais debatidos os acontecimentos do dia 11 de agosto para supostamente o bem de todos e da UFRJ, em particular. Ao propor um “esquecimento” do ocorrido, um apagamento da memória, um Historicídio, ignoram a dor da vítima! Ignoram as noites de sono perdidas, os livros que deixou de ler. Ignoram a felicidade que lhe foi roubada. Ignoram o sentimento do outro. Ignoram que não foi feita justiça. Ignoram que dois professores diretamente envolvidos nos atos foram completamente absolvidos mesmo tendo sido cúmplices de um dos ataques mais covardes presenciados dentro de uma universidade. 

6) Não é respeitoso se pedir silêncio para uma mãe que perdeu seu filho assassinado. Não é respeitoso com a vítima de uma tortura solicitar que fique calada em prol da paz. Não é respeitoso pedir que uma vítima aceite e cale diante das injustiças geradas pelos agressores. Para que o silêncio ocorra, é necessário a reparação do dano e que os malfeitores sejam exemplarmente identificados pela instituição. Isso não aconteceu na sua inteireza. 

6) Embora ninguém deseje que essa discussão seja eterna, também não achamos que seja salutar esconder os fatos ocorridos. Ao contrário, eles devem ser pedagógica e amplamente debatidos com vistas a subsidiar uma pauta antirracista na universidade e na sociedade brasileira para que não ocorram novos atos como esses. Não será omitindo o acontecido ou evitando debatê-lo que vamos avançar nessa luta. Muito ao contrário. Para todo racista, para todo machista, para todo LGBTQIA+fóbico, para todo autoritário, quanto menos se discute e se reconhece práticas racistas, melhor. Quem defende a não punição exemplar dos atos perpetrados no dia 11 de agosto flerta perigosamente com o racismo e a discriminação em geral.  

Diante de todo esse cenário, alertamos à direção do IFCS e sua egrégia congregação, para que não se omitam diante dos referidos problemas. Acreditamos no cumprimento das funções institucionais, para minimizar os danos que se apresentam. 

Enfim, o Quilombo do IFCS só tem a dizer para os Josués, Thaíses, Pedros e seus apoiadores dentro e fora da UFRJ que continuaremos na luta antirracista, denunciando toda forma de discriminação racial ou de qualquer natureza! Nossa força vem da ancestralidade de 4,8 milhões de africanos escravizados trazidos para o Brasil em migração forçada e seus descendentes – em mais 380 anos de escravidão. Seus saberes e suas culturas sequer são ensinados nas nossas universidades. Continuaremos nossa luta para que nenhum corpo negro mais sofra racismo impunemente nessa Universidade e nesse Instituto. 

Cordialmente,

Quilombo do IFCS

1 comentário em “CARTA ABERTA DO QUILOMBO DO IFCS SOBRE O RESULTADO DA SINDICÂNCIA DO CASO DE RACISMO NO DPTº DE CIÊNCIA POLÍTICA DA UFRJ

  1. Isabel Rocha Responder

    Concordo com o posicionamento do Quilombo! Não podemos aceitar nenhuma forma de discriminação .

    NÃO AO RACISMO!!

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